Manobra de Zema e do Novo contra reajuste de policiais vira briga com Judiciário e Legislativo
A manobra do partido Novo de acionar o Supremo Tribunal Federal (STF) contra reajuste de policiais mineiros teve duplo objetivo. Além de livrar Romeu Zema, único governador do partido, de pagar o aumento concedido de 41,7%, o Novo quer atingir em cheio o Judiciário e o Legislativo. Ao pedir a inclusão dos gastos com inativos nas despesas de pessoal, os aliados de Zema inviabilizam, sob a ótica fiscal, os Tribunais de Justiça e as Assembleias Legislativas e os Ministérios Públicos.
Os governadores João Dória (SP) e Romeu Zema afinam o discurso, foto Pedro Gontijo/Imprensa MG
Hoje, de acordo com decisão do Tribunal de Contas do Estado, as despesas com aposentados estão excluídas do cálculo e limites da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Se forem incluídos, os gastos extrapolariam os limites em Tribunais estaduais, Assembleias Legislativas e os Ministérios Públicos.
“A ação significa verdadeiro golpe à gestão dos Tribunais de Justiça. De par com o iminente dano aos Tribunais, a ação intenta reconhecer a constitucionalidade de dispositivos, cuja validade jamais foi arguida ou sequer negada pelos Tribunais”. A advertência foi feita pelo presidente do Colégio de Presidentes de Tribunais de Justiça, desembargador Carlos Alberto Alves da Rocha.
Tribunais pedem urgente intervenção da AMB
Em ofício à presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Renata Gil, o desembargador solicitou apoio da entidade em defesa do Judiciário no STF. “Além de utilizar-se de medida processual inadequada, o autor (Novo) demonstra distanciamento da realidade dos serviços judiciários”, disse Rocha. Para ele, a intenção impõe restrições insuperáveis aos tribunais, sob a ótica fiscal.
“A dedução das despesas com inativos e pensionistas do cálculo da despesa total com pessoal é procedimento previsto nos próprios dispositivos da Lei de Responsabilidade Fiscal. Em nome dos integrantes deste Colégio, encareço a urgente intervenção dessa Associação, em defesa do Poder Judiciário dos Estados”, reforçou ele.
TJMG: “Uma das mais virulentas agressões ao Judiciário”
Preocupado com a situação, o presidente do Tribunal de Justiça de Minas, desembargador Nelson Missias de Morais, fez enorme mobilização em Brasília. Com livre trânsito no STF, reuniu-se, nesta terça (3), com os ministros Alexandre de Morais e Dias Toffoli (presidente). Em seu ofício à presidente da AMB, Nelson Missias comparou a ação do Novo a uma agressão ao Judiciário. “Uma das mais virulentas agressões que se perpetram contra o Poder Judiciário Nacional, em todas as suas esferas de gestão e competência, especialmente aos tribunais de justiça estaduais”, apontou.
Segundo ele, as deduções das despesas com inativos e pensionistas é “procedimento perfeitamente legal” e em conformidade com a LRF. “Negá-lo, como quer o Novo, significa terrível golpe na boa gestão judiciária”. De acordo com ele, a metodologia de dedução das despesas com inativos e pensionistas é procedimento adotado desde 2003 em Minas. Para confirmar, anexou relatórios de gestão fiscal regularmente publicados pelo Poder Executivo.
Zema faz corpo a corpo em Brasília
Por conta do mesmo tema, mas por razões opostas, o governador Romeu Zema também cumpriu agenda em Brasília. Reuniu-se com o ministro Luiz Fux, do STF, e com o ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho. Tenta, para esta quarta-feira, encontro com o ministro da Economia, Paulo Guedes. Zema busca saída política e administrativa para não ser obrigado a pagar o reajuste que ele mesmo concedeu aos policiais mineiros, de 41,7%. Dizem, no meio político, que a forte crítica do governador paulista, João Dória (PSDB), ao reajuste de Zema a policiais seria outra maneira de reforçar a necessidade do veto.
Após negociar por seis meses com lideranças de policiais mineiros, Zema está disposto a recuar após pressão de seu partido. Enviado à Assembleia Legislativa, os deputados aprovaram o projeto e ainda estendeu o reajuste a outras categorias. Pelas contas do governo, só o reajuste dos policiais custará ao Estado R$ 9 bilhões, aumentando o déficit em R$ 5 bilhões. Ainda na Assembleia Legislativa, o vice-líder do governo, Guilherme da Cunha, disse que Zema concedeu o reajuste porque foi chantageado pelas lideranças de policiais. O projeto ainda depende da sanção do governador.
Oposição diz que indefinição gera incertezas
A oposição criticou a demora do governador em sancionar os reajustes aprovados na Assembleia em fevereiro. Para os parlamentares, a indefinição de Zema e as ações do Novo geram incertezas nas forças de segurança e nos demais servidores.
As críticas foram contestadas pelo deputado Sargento Rodrigues (PTB). Ele atribuiu o atraso na sanção à emenda apresentada pelo PT, que garantiu o reajuste a outras categorias. Classificou a iniciativa da oposição como “demagógica, inconstitucional e ilegal, apenas para jogar para a plateia”.
Ele ainda ressaltou que houve ampla negociação entre representantes da segurança pública e do governo, inclusive com intermediação de parlamentares. O deputado disse ter confiança de que a proposição será sancionada e que a extensão do reajuste será vetada.
Ainda na Assembleia, os deputados culparam o articulador político do governo, o secretario Bilac Pinto (DEM), chamando-o de “pai das maldades”. Segundo eles, o secretário teria armado o imbróglio para atingir o Judiciário e o Legislativo e enquadrá-los no ajuste fiscal. Aos deputados, Bilac reconheceu que errou ao apostar que a extensão do reajuste para outras categorias não seria aprovada. O bloco governista perdeu seis deputados no início deste ano, de 22 para 16 votos.